4 de julho de 2011

O nada...


Ela se incomodou, um dia, com o acúmulo de coisas que lhe cansavam... Resolveu limpar: desencostou os móveis, tirou as teias que se juntavam, eliminou as traças, desfez o mofo que umedecia as memórias, tornando-as sempre frescas... Pegou de um pano e foi apagando pó, retirando manchas, nódoas quase imperceptíveis, mas ela e só ela sabia que estavam lá...
Fez esse procedimento dentro de si em tudo, todo canto, cada fresta... impecável depósito onde nada ficou, nada restou, nada deixava sinais de vida... Ela seguia em sua limpeza, desinfetando o universo no qual sentia-se sufocada, atormentada, espalhando em toda parte o apagar de vestígios...
Ao fim do seu serviço, olhou em torno, buscou o conforto de observar a leveza que restara... e nada mais conseguia ver em lugar algum... nenhum parco sinal de memórias que a fizeram ser alguém um dia... Retiradas todas as marcas, ela apagou-se de existir: o peso saiu, o sufocamento extinguiu-se, a tormenta esvaziou-se e dentro do nada que sobrou, na vastidão de tanto espaço, ela se perdeu pra sempre e nunca mais se achou...

Um comentário:

  1. Oi, poetisa minha!

    Belíssima reflexão sobre o nada.Profundamente "filopoética"! Fez-me lembrar de um poema meu intitulado UM INSTANTE onde digo: "PERCO-ME DENTRO DE MIM \ E NÃO ME CONSIGO ENCONTRAR \ ESTOU EM MEU 'EUNIVERSO' SEM FIM..."

    Ósculos poéticos!

    M. C. Garcia

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